De joelhos no chão
Pergunto-me porque
transformaram a religião em pecado. Pergunto-me quem teve a audácia de falar em
nome de Jesus. Pergunto-me quem foi que começou com a insensatez de duvidar de
Deus.
Os olhos crentes encaram a
figura despida na cruz. Uma lágrima escorre enquanto seus ouvidos captam
atentamente cada palavra do pastor. O rabino entoa a cantiga e algo em seu
peito se parte. Porque ele pode sim ser uma pessoa melhor.
A bíblia em seu colo é
aberta e suas mãos passeiam pelos versículos da toráh. Bem feitas, unhas
grandes, dedos enrugados, cutículas aparadas, nós calejados. Na verdade, não
importa a idade, nunca é tarde demais para acreditar.
Seus ouvidos palpitam no
mesmo ritmo do coração da multidão. A reunião de tantas pessoas tem um efeito
avassalador, devastador. Tudo o que era ruim se quebra. Toda a ganância e
arrogância vão embora porque Ele disse que tens de ser humilde e sua posição,
de joelhos no chão, explicita tamanha rendição. Porque você veio do pó. E ao pó
voltará. Porque você não é diferente de ninguém. Seu dinheiro não te dá mais
humanidade e seu carro não te dá mais merecimento. E, principalmente, nada
disso garante seu lugar no céu.
Os pelos do braço se
arrepiam, os gritos do pastor anunciam uma verdade dura. Humano é o que você é.
E nada mais que isso. Pecador. Que merece absolvição como qualquer outro. Que
merece ser julgado no dia do juízo final. Que tem seu lugar guardado no
paraíso.
Mas não é por Ele que você
vai ser alguém melhor. Não é porque está escrito “não matarás” nas tábuas de
Moisés que você não vai matar. É porque, no fundo, você sabe que não é certo.
Não é simplesmente porque o pastor mandou. É porque seu coração se sente bem
assim. Não é para chegar ao paraíso, é por ter fé de que, um dia, tudo vai
importar e ser tirado a limpo.
Pergunto-me quem foi que
subestimou o poder da fé. Pergunto-me quem profanou o ato de ajoelhar-se e
agradecer. Pura e simplesmente agradecer. Porque não há ninguém que não tenha
nada ao ponto de não ser grato. E não há ninguém que seja tão bom que não possa
ser melhor. Porque todos nós podemos sim ser pessoas melhores e a religião pode
sim com isso contribuir. Porque, no fim, acreditar que existe alguém cuidando
de cada um de nós é reconfortante. E nos faz capazes de amar quem poderíamos
odiar.
Porque O
Senhor é meu pastor e nada me faltará.
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