Silencioso diálogo dos corações partidos

sábado, 18 de julho de 2015

Silencioso diálogo dos corações partidos


- Você precisa é de beber.

Olhei pr'o rosto da minha tia e não sei o motivo de não ter caído na risada ao ver sua careta. Talvez por causa do brilho de seriedade em seus olhos ou a sabedoria de quem entendia a história toda sem eu nem mesmo ter falado nada. Sua fala me fez enxergá-la de um jeito diferente; ela deixou de ser a irmã do meu pai para ser uma amiga.

Eu precisava mesmo beber?

Seria mais fácil me afogar em algumas latas de cerveja e deixar o álcool fazer todo o trabalho de colar um coração partido do que enfrentar a trágica realidade de ter uma alma aos pedaços.

Peguei um copo, uma latinha no freezer e resolvi seguir o conselho de alguém que já teve o peito feito em frangalhos mais de uma vez. Se aquilo não resolvesse, talvez não houvesse mais esperança alguma pra mim.

Seus olhos castanhos eram solidários e sinceros. Um convite claro a me abrir. Talvez um monólogo da minha alma necessitada por se esvaziar. Aquela mulher me entenderia. Sua experiência em ser abandonada pelo marido e em cuidar de dois filhos pequenos lhe davam a força e capacidade necessária para saber o que fazer em situações de crise. Ela poderia resolver qualquer problema e nada seria o fim do mundo para alguém tão forte. O que eu não daria para ser igual?

Abri outra latinha. Aquela já era a quarta. Consegui contar cada uma delas sem me perder. Aquilo seria forte o suficiente para mim?

As lágrimas começaram a escorrer e eu olhei para o rosto cansado da minha tia novamente. Seus olhos castanhos ainda me encaravam. Eram solidários e sinceros. Um convite claro a deixar tudo o que sentia sair. Ela não queria forçar nada. Sabia que, se eu tivesse que falar, falaria. E sabia que teria que ser aos poucos. Enquanto isso não acontecia, continuamos nosso diálogo silencioso de quem chora e de quem apoia apenas com sua presença. Ela não precisava dizer mais nada.

As lágrimas ainda teimavam em molhar meu rosto, mas minha voz não saía. Eu não conseguia falar. Não depois de tanto tempo em silêncio. Abri a quinta latinha e enxuguei o rosto. Mais algumas e, talvez, fosse o suficiente. Aquela mulher me entenderia como ninguém.

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