Cartas de quem já esteve aqui
Confesso que ainda abro aquela velha caixa de
sapatos uma vez por semana. Sento-me na cama e contemplo a superfície amassada
do papelão, tentando tomar coragem para jogá-la na lareira e assistir tudo
virar fumaça. Mas eu confesso também que nunca consigo.
Acaricio todas as memórias que vivem ali
dentro, brincando com os papéis e objetos que insistem em dançar na minha
cabeça, por entre meus dedos. Um velho frasco de perfume, algumas fotografias
envelhecidas pelo tempo, um marcador de página que tem a forma de um
pinheiro... Confesso que ainda não consegui rasgá-lo, mas eu prometi a mim
mesma que faria.
O velho diário que virou caderno de rascunhos
esconde risadas e melodias que, se eu tivesse ousadia o suficiente, soariam pelos
quatro cantos da casa. Embaixo dele, moram os envelopes pardos e papéis de
carta decorados com a caligrafia elegante de alguém que praticamente nasceu
escrevendo lágrimas nos olhos de quem se julgava incapaz de sofrer. Confesso
que leio cada uma delas antes de dormir, pelo menos uma vez por semana. Nada
mal, para quem as lia todo dia. Talvez eu consiga jogá-las de vez na lareira.
Talvez meu sofrimento queime junto com a tinta da sua caneta.
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