Pecado

quarta-feira, 27 de maio de 2015

Pecado


As pessoas não são boas. Não que eu já não o soubesse antes, mas Meredith provou ser uma das mais cruéis espécimes do sexo feminino que eu já conheci. Como se já não bastasse ser uma mulher, Meredith também é uma pessoa perversa que não reconhece o bem que lhe fazem.

A quem quero enganar? Ela não é a vilã. É só mais uma vítima de sua própria fragilidade.
Vivia andando pelos becos imundos e sombrios de uma cidade corrompida. Vendia seu corpo a quem pagasse o suficiente para que ela tivesse o próximo café da manhã.

E eu, o maior idiota da face da terra, ignorei todos os motivos pelos quais uma pessoa vai parar na rua. Apenas olhei seus olhos azuis e pensei que uma criatura tão bela, apesar da sujeira, não merecia aquela vida. O maior erro que um ser humano pode cometer é deixar de pensar.

Vi o que mais ninguém via. Meus olhos foram enganados pela pele macia coberta de poeira e pelos lábios carnudos. Estava acabada, era verdade, mas ainda era bela. Seu rosto estava ferido por algum soco que levara e seu cheiro faria qualquer um com estômago mais fraco ter náuseas. Mas Meredith era mulher mais linda que eu alguma vez já vira. Eu acreditava em sua alma. Era tolo o suficiente para algo assim.

Fiz o que meu insano coração mandava e a levei-a dali. Agora sei que foi tolice, Meredith já havia sido corrompida pelo submundo, mas eu precisava fazer algo. Precisava ajudá-la.
Dei-lhe casa, comida, roupas e sapatos. Dei-lhe meu coração. Meu maldito, bondoso e ingênuo coração.

O primeiro ano foi tolerável. Ela se sentia deslocada, mas eu acreditava que era normal. Uma mudança como aquela não seria aceita de um dia para o outro. Apresentei-a aos meus parentes, amigos e companheiros. Lhe prometi proteção. Em todos os sentidos, lhe prometi absolvição. E, quando dei por mim, não havia mais volta. Eu a amava. Por deus! Eu amava aquela mulher loira que conhecia os mais intricados segredos do corpo humano. Aquela mulher que me incendiava com apenas um olhar havia se tornado dona do meu próprio coração.

De guardião à amante, do celibato à perdição.

Renunciei minha vida, minha escolha até então acertada. Abri mão da pureza e a segui até os confins do que me parecia o paraíso e hoje vejo que é o inferno.

Iríamos nos casar. Na mesma igreja onde eu antes celebrava minhas missas. Nos amávamos e estávamos felizes. Pelo menos eu estava.

Então Meredith sumiu. De uma hora para a outra. Como um sonho bom do qual somos obrigados a despertar, Meredith se foi. Só que não era um sonho e meu peito doía. O que eu havia feito de errado? Qual foi o meu pecado?

Encontrei-a no mesmo lugar de antes. Ela estava no mesmo beco fétido contando umas poucas moedas enquanto sussurrava que teria que arrumar mais um pouco para comer um salgado. E, por mais estranho que pareça, ela estava em casa.

Percebi que nada a tiraria de lá. Meredith já tinha a alma podre demais para que fosse libertada. O pecado a consumiu e seus olhos azuis nunca mais bilharam em nenhum outro lugar. Não por escolha, mas por já ser algo enraizado em sua natureza. O mal não surge de uma hora para a outra. Ele nasce e vai crescendo no coração dos mais fracos. Até tomar conta de tudo.

Mas ainda a amo. E a dor por vê-la em estado tão deplorável corrói minha alma. E o desejo arde como se fosse o próprio fogo do inferno. Não posso salvá-la, logo, não posso salvar a mim mesmo. Não posso retornar ao celibato e não posso mais ser eu mesmo.

Então, peço que perdoe-me, padre, pois eu pequei.

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