Ausência

domingo, 19 de abril de 2015

Ausência



Lágrimas frias como a neve escorrem pelo meu rosto enquanto observo as cordas serem, aos poucos, soltas.

Dizem que, quando uma pessoa está prestes a morrer, sua vida inteira passa por seus olhos em poucos segundos. Foi assim para você? Porque é assim para mim. Em todos os momentos da minha vida, você esteve comigo. Sempre ao meu lado. Não estou morrendo, não fisicamente, mas me lembro de tudo. O simples ato de lembrar me mata. Me lembrar de cada palavra, cada gesto, risada, cada lágrima...

A vida tem um jeito perverso de brincar com o que dizemos. Você me disse uma vez que eu sentiria sua falta se, por acaso, partisse. Como sempre, estava certa. Mas nomear o sentimento que acompanha sua ausência como saudade seria subestimar o lugar que ocupa na minha vida. Um substantivo tão simples carece de intensidade para definir a desolação na qual se encontra meu coração neste momento.

Sob o sol escaldante, rodeada por pessoas enlutadas, eu sinto frio. Um frio que só piora enquanto o caixão desce. E dói saber que você, que é a única que pode aquecer minha alma, nunca mais voltará.

Mas, assim como “saudade”, “dor” também carece de força para definir o estado decadente no qual se encontra a minha alma. A lembrança da sua voz, o cheiro do seu perfume no carro, suas roupas no armário e até sua decoração no quarto me atormentam, me seguem onde quer que eu vá.

Mas apagar seu cheiro, queimar suas roupas ou excluir de vez seu gosto não me serviria de consolo e nem diminuiria minha dor.

Consolo... Quem se atreveu a nomear algo que nem sequer existe? Uma utopia de almas desesperadas por um alívio que nunca encontrarão. Não há nada que possa apagar as lembranças, enxugar as lágrimas, esconder sua imagem ou abafar sua voz. Nada que me faça esquecer. Assim como nenhuma palavra pode definir meu tormento, nada pode levar a agonia do meu peito. Nenhum “tapa-buraco” ou nova lembrança. Seu silêncio grita e sua ausência me emudece.

Não ter nada para falar, nada que eu possa fazer, leva minha mente aos limites da sanidade. Aos poucos, vejo a mim mesma enlouquecer de saudade. Apenas mais uma que veio de lugar algum indo na direção de lugar nenhum. Observar a terra cobrir seu corpo faz com que novas lágrimas escorram e a ferida não cicatrizada, mais uma vez, é cutucada.

Quantas vezes mais eu passarei por isso? Meu coração vai se cicatrizar ou esse tormento se tornará constante? Por quantas vezes mais esse buraco em meu peito dará sinal de vida e arderá ao ponto de me fazer ansiar pela morte? Quem sabe não nos encontremos, então?

Não te ver, não ouvir sua voz me guiando ou sentir seus braços ao meu redor, me assusta e me apavora.

Me diz, o que farei sem você? Com que pernas caminharei? Que conselhos seguirei? Que mãos enxugarão minhas lágrimas agora que as suas não podem mais fazê-lo?

A resposta é óbvia demais para o meu próprio bem.

Andando pelo cemitério, levo minhas mãos à minha própria face e enxugo as lágrimas que já escorreram. Tolice. Outras tomarão esse lugar. Agora sou só eu.

Assustador... Mas, mais do que isso, é torturante.

Não precisaria me consolar, ou me fazer algum favor. Era só estar aqui. Só estar viva. Sentirei sua falta como um pássaro engaiolado anseia por voar. Desejarei sua presença como um tubarão precisa da água do mar.

Mais do que em vídeos e fotografias, você estará em minha alma. Marcada a ferro quente e mais profundamente que uma tatuagem. Em meu peito, em minha memória, na minha cabeça e em meu sentimento.

Porque, mais do que qualquer outra pessoa, eu te amo, mãe.

2 comentários :

  1. cara... meus olhos arderam aqui, sério ;-; que texto lindo e... extremamente triste. ainda mais lido na semana do Dia das Mães TT^TT vou até abraçar a mamãe ali, pera...

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    1. Fico feliz que tenha gostado. Muito obrigada por ler e comentar!

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