Os frágeis sonhos de Angeline
Assim como todas as outras
meninas, Angeline sonhava em ser mulher. Já poderia imaginar-se usando os
sapatos de salto alto da mãe e carregando as bolsas bonitas como as que a tia
usava. Também sorriria como a mulher da novela e usaria roupas tão belas quanto
as dela.
Já aos cinco anos de idade,
a pequena e doce Angeline criou um mundo repleto de sonhos e anseios que
realizaria quando chegasse a hora. Porém, enquanto esperava pelo momento certo,
ela se contentaria em sentar-se ao lado da mãe e ficar horas observando-a se
maquiar, arrumar os longos cabelos castanhos e borrifar os mais gostosos
perfumes que havia no mundo. Era o jeito mais gostoso de aprender.
Mesmo com tão pouca idade, a
menina já sabia que era privilegiada por ser quem era e por ter o que tinha.
Seu pai, dono de uma enorme rede de supermercados, lhe dava de tudo e cuidava
para que sua linda menina e sua bela esposa fossem tão felizes quanto se é
permitido ser.
Angeline, por sua vez,
fazia o que as crianças sempre fazem e sonhava com um futuro onde seu sorriso
seria constante graças à felicidade que habitaria seu coração. Seu marido seria
tão belo e atencioso quanto seu pai e seus filhos seriam uma réplica de si
mesma. Ela cuidaria da casa e John, o garoto que conquistara seu jovem e
inocente coração, trabalharia fora todos os dias. Os finais de semana seriam
para a família e eles visitariam os avós de suas próprias crianças.
Como podem perceber, a
pequena princesa Angeline criou um gigantesco paraíso onde viveria quando
fosse mais velha e tivesse altura o suficiente para lavar as vasilhas.
Mas o destino é cruel e o acaso
não perdoa os sonhadores. Se por obra de algo prescrito por um Deus ou por mero
acaso, ninguém sabe, mas Angeline não cresceu. Não entrou na igreja vestida
de noiva e nem saiu para jantar a noite. As longas conversas nas quais
descrevia seu imenso castelo se transformaram em lágrimas que caíam em cima do
seu pequeno corpo pálido, repousado dentro do caixão de madeira branca.
Tão rapidamente como vieram,
os sonhos se foram.
Bastou um passo em falso
próximo da escada para que o sapato, grande demais para seus miúdos pés,
tombasse de lado e seu corpo se desequilibrasse e despencasse escada abaixo,
rolando umas cinco ou seis vezes antes de cair e quebrar o pescoço no último
degrau. O grito da babá foi ouvido por toda a mansão e os soluços da mãe eram
intermináveis lamentos de uma alma destroçada.
Mal havia chegado, Angeline já se fora.
Em seu lugar ficou apenas um enorme vazio no peito dos que a amavam e mais de um milhão de sonhos que nunca seriam realizados.
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