De algum futuro distante

sexta-feira, 10 de abril de 2015

De algum futuro distante


De algum lugar num futuro distante...

Caro leitor do passado,

Assim como todas as conquistas do mundo, tudo começou com um sonho que parecia mais uma utopia. O ideal da paz mundial estampado em todo lugar por onde eu passe e o peito cheio de orgulho com a frase “Nós conseguimos!” estampada nas testas, blusas, bolsas... Vencemos a guerra contra a discórdia. E nem  mesmo precisamos guerrear.

Mentira. O mundo se transformou num completo caos onde se misturavam meio ambiente, violência, economia, evolução, conservadorismo e mais coisas do que você pode imaginar. Mas, no meio da crise, de alguma forma milagrosa, o trem voltou para a linha certa (ele estava nela, por acaso?) e não mais corre perigo de descarrilar. Pelo menos é o que os novos governantes dizem nos comerciais.

Agora, temos sorrisos estampados em rostos belos, cumprimentos cordiais e almas felizes. Nada de brigas, discussões, o trânsito é tranquilo, preços são justos e o crime foi, oficialmente, banido. O mundo perfeito, tão sonhado pelas pessoas do seu tempo, foi conquistado. É tão anormal viver sem nenhum tipo de tristeza que as pessoas ainda não se deram conta do dano que isso nos causa. Ou perceberam e não querem admitir. A arrogância humana sempre foi o pior inimigo de qualquer entidade. Apesar de todos saberem disso, ninguém se importa. Parece que nos transformamos em robôs, que só fazem o que mandam e não pensam muito para isso.

A morte? Ela está aqui, à espreita, espiando as pessoas mais velhas. Morrer de velhice é tão comum que as pessoas nem mesmo choram quando seus avós, pais, tios partem. Já passaram tempo o suficiente ao seu lado, eu acho. Acredito que arrumarão um modo de banir de vez os rituais funerários também. Não ter reação ao perder algo ou alguém... Me pergunto onde é que foi parar a natureza humana no meio desse bando de robôs de carne e osso sem lágrimas.

Antes, o mundo estava em equilíbrio. Com os dois opostos coexistindo, as pessoas sabiam dar o devido valor ao melhor deles. Conhecer os dois lados da moeda, o amor e o ódio, o feio e o belo, o azedo e o doce, faz com que tenhamos uma visão mais ampla de tudo o que implica escolher um ou outro. Mas nós cometemos o pecado de esquecer.

É verdade que a criminalidade não mais existe, que a violência foi extinta. Muitos não sabem nem qual o significado dessas palavras, mas... Talvez o custo tenha sido alto demais. E nós não temos como pagar.

Porque o homem pode tudo, quer o mundo, mas não assume os próprios erros. E ele sabe disso. E, como o ser humano é um bicho imbecil e confiante demais para fazer bem ao mundo, ele simplesmente estabelece metas para cumprir. Como um vendedor de carros. Sem pensar no que pode acontecer, a única coisa que importa é conseguir. Depois que alcançar a meta do mês ele simplesmente vai procurar algo ainda mais alto, sonhar ainda mais além do nada que ele pode controlar.

Sem violência, todos satisfeitos com todo mundo, sem brigas, sem mortes sem sentido... Esse é o nosso mundo hoje. Mas falta algo. Pode chamar de “a incrível capacidade de nunca se sentir satisfeito” ou qualquer outro nome que queiram atribuir ao caráter egoísta e insatisfeito do ser humano que nos persegue ao longo dos séculos. Com todos completamente satisfeitos o tempo inteiro, sobra espaço para... Para que? Ninguém mais procura pela felicidade ou persegue seus sonhos. Os sorrisos não são mais tão felizes quanto os que estampam imagens antigas, os olhos retêm toda a indiferença de uma alma acostumada a ter tudo de mão beijada. Somos uma manada de seres que apenas sobrevivem.

Sim. Conquistamos o universo e acabamos com os grandes problemas do mundo. Estamos tão satisfeitos que nos transformamos em seres que apenas existem, como amebas: fazem o que devem fazer e pronto. Não sentimos. Acabou o amor, a felicidade, se foi todo aquele fervor e vontade de conseguir algo mais. Rostos apáticos que não dão valor à nada, pois já têm tudo. Almas inertes fingindo não ver o mal que causaram a si mesmas. Se é que ainda podem ser chamadas de “almas”...

Caro leitor do passado, seu mundo caminha na direção do meu. A “evolução” que ele conhecerá é melhor em sonhos, acredite em mim. Carros que voam, juízes e advogados sem trabalho, economia estabilizada e mais outros muitos anseios que seu povo tem acompanham a ruína do coração da espécie. Provocam a morte do que deveria existir dentro de nós.

Nosso cérebro evoluiu, mas a vontade de nos tornar algo melhor e a felicidade ao consegui-lo morreu em algum lugar, não muito além do seu tempo.

Por favor, não faça como nós. Não deixe isso acabar.
Jenna Stuart

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